A oficina de performance, ministrada pelo João de Ricardo, da que participei na pré-bienal, além de ter despertado em mim um novo olhar sobre o mundo e sobre arte, me fez refletir sobre uma série de questões que aproximam a arte da antropologia.
A experiência de realizar, em grupo, ações individuais aleatórias dentro de um espaço delimitado, que por sua vez estava inserido num espaço muito maior – a rua – continha o desafio de manter uma unidade dentro da diversidade. Cada um de nós precisava estar inteiramente em si mesmo, para estar no outro e formar um todo. O exercício de acoplamento, que se seguiu, configurou exatamente isso e abriu o nosso campo de visão. Caminhamos pelo centro da cidade, lentamente, levemente acoplados, abertos, suaves, contemplativos e ao mesmo tempo interiorizados.
O fazer antropológico se encontra com a fazer artístico na performance de acoplamento, pois assim como o artista se envolve com o meio, com a ação e com o público de uma maneira muito particular, o antropólogo se envolve profundamente e verdadeiramente com todos os aspectos do grupo pesquisado. E é aí que entra a questão de estar inteiro para ser grupo, e de estar perto para que aconteça, para que a experiência surja, única, livre e completa.
Estou lendo um livro que narra a trajetória de um antropólogo que decide estudar o mundo do boxe, e, para isso, ele entra para uma academia de boxe no subúrbio de Chicago, nos EUA. As coisas seguem um rumo, que quando ele percebe, está totalmente envolvido por aquele universo do pugilismo e acaba virando um boxeadro amador. E este fator, diferente do que muitos poderiam pensar, não impediu que ele realizasse a pesquisa, muito pelo contrário, fez com que o trabalho dele fosse uma referência para a antropologia e para a literatura, pois o texto, além de ser reflexivo, é altamente é poético e envolvente. O autor esteve próximo, esteve por inteiro, e esteve aberto para que as experiências surgissem.
Essa é uma nova forma de se fazer antropologia, cada vez mais legítima – pasmem! – no mundo acadêmico. Acredito que o movimento do João de Ricardo em direção aos processos híbridos de criação, também configuram uma nova forma de fazer arte. Uma forma bonita e prazerosa de estar no mundo.
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